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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

O CÓDIGO FLORESTAL E A CIDADE - APROGEO-SP ENTREVISTA O GEÓGRAFO MÁRCIO ACKERMANN

A prevenção, contenção e recuperação de áreas de risco, além do planejamento ambiental e urbano, são importantes áreas de atuação para o geógrafo e formam mercado amplo que abrange desde a atuação em empresas privadas aos mais variados órgãos públicos.


Diante dos acidentes ocorridos nas últimas semanas nas regiões de Nova Friburgo (RJ), Ferraz de Vasconcelos (SP), Terezópolis (RJ) e Mauá (SP), além de outros municípios e regiões brasileiras e, considerando o papel do geógrafo na identificação, proteção, controle e monitoramento das áreas de risco de inundação e de escorregamento, APROGEO-SP abriu seu espaço, por meio do Blog, para comentar e discutir o tema. Para isso, publica uma entrevista com o Geógrafo Márcio Ackermann, Mestre pelo IPT desde 2003, que atua na área de consultoria ambiental há aproximadamente 20 anos.

Como sabemos, o estudo dos riscos da ocupação urbana em áreas de preservação permanente ou de alta instabilidade geotécnica não são nada recentes. Este assunto tem ganhado bastante projeção na mídia nos últimos tempos.

Aproveitamos para agradecer ao Geógr. Márcio pela entrevista concedida, que certamente contribui para o debate a respeito da expansão urbana e dos riscos. Convidamos a todos a participar, deixando suas dúvidas e comentários no blog!



Márcio Ackermann - Mestre pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) em 2003, Bacharel em Geografia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) em 1995 e Técnico Agrícola pela Escola Agrícola de Pinhal em 1985. Atuou durante 10 anos no Departamento Estadual de Proteção aos Recursos Naturais (DEPRN), onde trabalhou como geógrafo no Vale do Ribeira, na Região Metropolitana de São Paulo e como supervisor, da Equipe Técnica Avaré. Em 1997 fundou a Ackermann Consultoria Ambiental S/C Ltda., onde atua desde então. É afiliado da APROGEO-SP e foi vice-presidente da associçao entre os anos de 2008 e 2010.


ENTREVISTA:

(APROGEO-SP) Você tem dado uma série de entrevistas na mídia a respeito dos desastres que ocorreram recentemente em algumas cidades brasileiras, com escorregamentos e inundações em áreas urbanas. Poderia comentar um pouco sobre este assunto para o Blog da APROGEO-SP?

(Geog. Márcio Ackerman) Os recentes acidentes como escorregamentos, enchentes e inundações, na verdade são recorrentes e sazonais. O fato novo é que a imprensa começa a tratar o tema com vistas a identificar os responsáveis. A chuva não é a responsável por tantas mortes em Santa Catariana, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Grande Salvador e Grande São Paulo.

Há em nosso país legislações que tratam de políticas públicas preventivas a esses graves problemas; lamentavelmente pouco respeitadas. O Estatuto das Cidades, que disciplina a gestão urbana, a Lei 6.766/79, que regulamenta o parcelamento do solo, o Código Florestal que define as áreas de preservação permanentes, bem como demais diplomas legais no âmbito dos Estados e Municípios, estabelecem onde e como é possível implantar e desenvolver as distintas atividades humanas.

O licenciamento e a fiscalização dentre tantos outros serviços públicos, são precários. Isso quando não identificamos interesses políticos de pobre visão pública ou preocupados com benefícios privados que enfraquecem e desqualificam o sistema de licenciamento e fiscalização. Quadro que se observa em diferentes instâncias de poder e infelizmente, nos mais distintos partidos políticos.

Apenas para citar exemplos: em Mauá - ABC e Capão Redondo - São Paulo houve vítimas fatais decorrentes de escorregamentos. Tanto em Mauá quanto em São Paulo, os locais desses escorregamentos eram áreas de preservação permanentes de diferentes feições (nascentes, encosta com 45º, margem de curso d'água e topo de morro). Pois bem, em área urbana, o artigo 22 do Código Florestal em seu parágrafo único, define que a responsabilidade de fiscalizar essas áreas, em zona urbana é do município. Como também a Lei de Crimes Ambientais, na Seção dos Crimes contra a Administração Ambiental, em seu artigo 68 estabelece: “Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental"... É Crime!Pena: detenção, de um a três anos, e multa. Ou seja, o responsável do poder executivo (o prefeito), nesses dois casos de escorregamento, deve, pela legislação em vigor, responder por crime. Como o prefeito de Niterói, da mesma forma, pelo escorregamento no morro do Bumba, lá inclusive mais grave, pois a municipalidade instalou infra-estrutura em local totalmente inadequado sob o aspecto geotécnico. (uma rua sobre um antigo lixão)

Neste sentido ressaltamos a importância desse meio de comunicação da APROGEO-SP, pois quanto mais informação e conseqüentemente, mobilização da sociedade, maiores serão as garantias para nossa reação


(APROGEO-SP) De que forma o Geógrafo pode atuar na prevenção de catástrofes como a que ocorreu na região serrana do estado do Rio de Janeiro, agora no ano de 2011?

(Geog. Márcio Ackerman) O Geógrafo é um profissional apto a contribuir tanto na prevenção, como no controle e no resgate, dessas catástrofes. Por exemplo, os Mapas de Declividade são fundamentais, pois encostas com inclinação entre 25º a 45º são suscetíveis a processos de instabilidade, o que pode ser agravado em decorrência do uso e ocupação do solo desordenado, e principalmente pelo inadequado escoamento das águas pluviais. Mapeamento das APP's como nascentes, topo de morro, encostas com 45º também são feições de relevo com restrições ao uso, conforme define o Código Florestal, que devidamente mapeadas podem colaborar em muito na prevenção. Ao associar tais mapas às condições de solo e à geologia, teremos maior refinamento na informação e nos resultados. Porém é importante destacar que a dinâmica superficial é um indutor independente das características geológico-geotécnicas.

Por exemplo, em Mauá o primeiro escorregamento de 05/01, que vitimou mãe e filho, foi resultado da dinâmica superficial, com encostas desflorestadas, topo de morro ocupado com drenagem inadequada, cabeceira de drenagem (nascente) e habitações precárias assentadas em jusante, associados ao alto índice pluviométrico. Independente do embasamento geológico as condições inapropriadas do uso e ocupação do solo, nesse caso, foram os fatores. Tais circunstâncias são perfeitamente identificadas por um bacharel em geografia.

As formas de contribuir são muitas, desde subsidiar o movimento social com informações para exigir das autoridades devidas providências (até na sala de aula), atuar em órgãos públicos, instruir Promotorias de Meio Ambiente das Comarcas (todos os Fóruns Judiciais), atuar no planejamento urbano com vistas a tais questões, na fiscalização e licenciamento de distintas atividades, enfim o geógrafo é um profissional que freqüentemente integra equipes que trabalham com esse problema. Na região serrana mesmo havia um estudo que apontava os riscos, este estudo foi desenvolvido por uma Professora de Geografia da UFRJ.


(APROGEO-SP) No dia 12/02/2011 será lançada a segunda edição do seu livro, A cidade e o Código Florestal. Como foi a experiência de escrever este livro e qual está sendo a receptividade do tema na sociedade brasileira?

(Geog. Márcio Ackerman) O livro é resultado da pesquisa de mestrado que desenvolvemos no IPT/SP. Aborda exatamente as funções que as áreas de preservação permanente exercem nas cidades, ou melhor, nas áreas urbanas, e a correlação direta com acidentes geológico-geotécnicos. Fizemos uma leitura convergente entre o Estatuto das Cidades e o Código Florestal; a pesquisa foi concluída com recomendações técnicas para os gestores públicos municipais tratarem da questão, inclusive tais recomendações tornaram-se um projeto de lei aprovado na Assembléia legislativa de São Paulo - PL 213/07. Este projeto foi vetado pelo então governador José Serra e, no momento, se busca a quebra do veto na Assembléia.

A experiência de escrever o livro, na verdade, foi muito devida à influência de profissionais e amigos que apoiaram a conclusão da pesquisa e indicaram a relevância do tema, dentre esses meu orientador Prof. Dr. Omar Yazbek Bitar, ao qual aproveito para agradecer.


(APROGEO-SP) Estamos vivendo um momento em que mudanças no Código Florestal Brasileiro estão sendo discutidas nos Plenários da Câmara dos Deputados e do Senado, com aprovação na Câmara. Quais são as principais mudanças propostas no novo texto do Código e como você as avalia?

(Geog. Márcio Ackerman) As mudanças propostas visam debilitar a Política Florestal Brasileira, na medida em que anistiam desmatamentos ilegais e recentes, eliminam feições de relevo definidas como APP - área de preservação permanente, como topo de morro e as planícies de inundação (o maior leito sazonal). Viabiliza a permanência das ocupações irregulares em APP como encostas com 45º, reduz o índice de reserva florestal, quando não elimina tal exigência, desregulamenta o Sistema Nacional de Meio Ambiente, favorece e fomenta desmatamento nos biomas da Mata Atlântica, Amazônia e Cerrado. Ignora que o Código Florestal também é aplicado em área urbana, em particular com relação às funções exercidas pelas APP's, o que certamente acentua o risco de eventos como os ocorridos na Região Serrana do Rio.

Enfim a alteração proposta não visa aperfeiçoar o Código florestal nem tão pouco favorecer a agricultura familiar e a pequena propriedade como enaltece o Deputado Aldo Rebelo (PCdoB), relator do projeto.


(APROGEO-SP) Baseado na sua experiência de quase duas décadas de atuação como geógrafo (17 anos), como você avalia a evolução do mercado de trabalho neste período e as perspectivas para a atuação dos geógrafos?

(Geog. Márcio Ackerman) Acho que o mercado de trabalho tem identificado o geógrafo, de forma crescente, como um profissional com habilidades e competências importantes, as quais exigem de nossa categoria maior divulgação, valorização e inserção. As perspectivas são promissora para todos aqueles que vão a luta.


(APROGEO-SP) Em 1997, você passou a atuar em sua própria consultoria ambiental. Quais são as principais características dos seus clientes e como tem sido a prospecção de projetos? Aconteceu alguma mudança na visão empresarial e pública a respeito das questões ambientais?

(Geog. Márcio Ackerman) A visão está mudando em toda sociedade, a legislação, a necessidade de licenciamento, enfim os avanços são significativos num intervalo de tempo relativamente curto.

Tornar-se empresário é um processo muito difícil, pois a atuação técnica não significa muito quando o assunto é administrar uma empresa, ou sua vida profissional. Estabelecer-se no mercado é um processo lento, que exige muito esforço e aperfeiçoamento contínuo, e não se trata de teoria. Aperfeiçoar-se como pessoa, na forma de se relacionar, manter sua postura ética, posições técnicas, sem necessariamente agir como polícia

Porém, vale destacar que apesar da aspereza do caminho os resultados são positivos ao longo do tempo, pois efetivamente vemos melhora em todos os setores de nossa vida. O que muitas vezes a rotina e a comodidade do poder público não exigem de nós. Importante destacar que se tornar empresário não foi uma opção, na época o governo de plantão cassava os técnicos que tinham por hábito atuar com rigor e compromisso com legislação e nesse processo fui à busca de melhores condições de trabalho (liberdade de atuação)

(APROGEO-SP) Qual a importância do CREA na sua atuação profissional? E como empresa?

(Geog. Márcio Ackerman) O CREA é nosso certificador, todos nossos trabalhos exigem ART - Anotação de Responsabilidade Técnica, bem como, nossa empresa tem seu registro no CREA. Os profissionais que trabalham conosco precisam de registro no CREA. Vejo isso como positivo, com a ressalva de que precisamos lutar por nosso espaço!


(APROGEO-SP) Como podemos adquirir a segunda edição de seu livro?

(Geog. Márcio Ackerman) Convidamos a todos para o lançamento da segunda edição do Livro; A Cidade e o Código Florestal, neste sábado, dia 12 de fevereiro - Livraria Martins Fontes; Av. Paulista, 509, piso superior, a partir das 15:30h. Também é possível adquirir o livro por meio de solicitação no nosso site www.ackermann.com.br


Currículo Lattes de Márcio Ackermann

Consultoria Ambiental